A estiagem prolongada e as altas temperaturas reduziram a oferta de pastagens em Mato Grosso. Fatores estes que, além de prejudicar as lavouras, ameaçam a criação de animais, provocando queda de produtividade e até mesmo desestimulando ainda mais a pecuária leiteira no estado.
Após enfrentar uma seca de quase 100 dias em 2009, quando perdeu três animais por falta de alimentação, o produtor rural Antônio de Araújo Sobrinho decidiu dar um tempo na atividade leiteira. Ele segurou 25 bezerros e comercializou o restante do rebanho.
Segundo o produtor, para não ficar sem renda, aceitou a proposta de um vizinho para tirar o leite e dividir o lucro da produção. Entretanto, a estiagem que enfrentou no passado voltou a castigar a região. O rebanho do sócio sente os efeitos da falta de água, que vem resultando queda na produtividade e ameaçando mais uma vez a permanência na atividade.
“Já caiu uns 20 litros. Estamos tirando uns 80. Daqui mais uns dias se não chover não sei o que ele vai fazer, porque os pastos dele acabaram onde o gado está. Eu hoje fazer investimento em vaca, pagar R$ 20 mil em uma vaca, é prejuízo”, conta Antônio de Araújo Sobrinho.
O secretário de Agricultura de Nova Brasilândia, Renato Pereira de Souza, lembra que na temporada 2019/2020 o município enfrentou uma estiagem e que o cenário no ano 2023/2024 “parece ser o mesmo”.
“Deu algumas chuvas no início, mas a estiagem está bem forte. O produtor está penando para se manter na atividade. A gente chega na propriedade e vê os animais com bastante costelas mostrando, os animais bem abatidos”.
O secretário de Nova Brasilândia relata que a queda na produtividade no município está entre 20% e 30%. “Tanto no leite quanto de corte. Estamos com essa estimativa. Temos a preocupação de aonde esse cenário vai chegar. Tem muitos produtores deixando a sua atividade, principalmente na produção de leite, um cenário muito impactante para nós”.
Municípios ligam sinal de alerta econômico
A perspectiva de uma produção menor no campo traz também um sinal de alerta para Nova Brasilândia, já que a produção leiteira é considerada uma importante fonte de renda para investimentos no município. De acordo com a prefeita, Marilza Augusta de Oliveira, a queda na receita advinda da agropecuária por causa da seca pode chegar a 20% este ano.
“Está todo mundo apreensivo, porque era um momento para estar com bastante chuva e a estamos vendo um período temeroso para os produtores. E pode impactar negativamente nas finanças tanto na nossa arrecadação quanto lá na ponta para o produtor”.
A prefeita destaca que a palavra de ordem diante do cenário, no que tange a investimentos, é cautela.
“O momento pede muita cautela. Tem que continuar trabalhando. Não podemos desistir. Temos que acreditar, mas um passo de cada vez nesse momento. Lá na frente as contas precisam fechar”.
A prefeita salienta ainda que apoio aos produtores de leite são ofertados pela gestão municipal para minimizar custos e prejuízos, como a questão do transporte do leite.
Animais morrem diante seca
Em Dom Aquino a pecuária leiteira também foi bastante prejudicada pela estiagem deste ano. Algumas propriedades chegaram a registrar a morte de animais, como é o caso do produtor Douglas Rocha Souza que perdeu duas vacas em lactação por causa da seca. O prejuízo no bolso do pecuarista, que teme perder mais animais, foi de quase R$ 15 mil.
“Se não bater em cima e tratar, ajeitar de um lado e de outro, a tendência é morrer mais [animais]. Pasto não tem. Ficou muito difícil para tratar o gado. Na época do leite subir fez foi baixar, fez o ciclo ao contrário”, conta o produtor que possui silagem para cerca de 30 dias ainda.
Na propriedade do pecuarista Alex Sandre Moreira dos Santos, há quase três meses não ocorre “uma chuva boa”. Por lá chegou-se a registrar temperaturas na casa dos 46 graus.
“Aí nada aguenta. Nem animal, nem pasto. O calor está complicado para o animal, a produção que ele produz nas águas hoje está a metade. Estamos torcendo para essa chuva vir logo. Tem que vir boa, porque nós estamos precisando plantar. Eu tenho um pedacinho que planto milho para silagem e estou torcendo para essa chuva vir logo. Está passando da hora”.
Concorrência com o leite em pó importado
Conforme o setor produtivo, a desvalorização do produto em plena entressafra também é atribuída a concorrência com o leite em pó importado do Mercosul.
“O trato baixou esse ano. Falamos que íamos trabalhar um pouco mais tranquilo, aí chega agora e o leite baixa também. Essa proposta do governo, essa importação de leite, cai o preço e a tendência agora é ficar pior, porque se começar a chover aumenta o leite. A probabilidade é de baixar mais o leite. A mão de obra está escassa. Ninguém mais quer trabalhar”.
Em passagem por Mato Grosso nesta semana, o ministro da Agricultura e Pecuária, Carlos Fávaro, pontuou que os preços ainda estão achatados, há problema de seca e que “precisamos recuperar as desigualdades entre os produtores de leite neste país”.
O ministro reforçou que “as ações governamentais foram tomadas e hoje não está entrando mais leite em pó importado na quantidade que vinha acontecendo nos últimos meses. São ações estruturantes que vão continuar sendo tomadas para fortalecer essa cadeia que gera empregos e muitas oportunidades no Brasil”.
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