Além das dificuldades no campo causadas pelo clima instável, produtores na região do Vale do Araguaia, em Mato Grosso, agora enfrentam um novo desafio fora da porteira: divergências nos laudos de classificação de grãos e descontos considerados abusivos por parte de algumas empresas compradoras.
Na avaliação do produtor Paulo Costa Biancalana, o excesso de chuvas e os entraves logísticos foram os fatores que mais desafiaram os trabalhos no campo nesta safra 2024/25. Para colher os últimos talhões dos 3,8 mil hectares de soja plantados nesta temporada na fazenda em Canarana foram dias de espera e céu fechado.
Segundo ele, a presença de silo-bolsa na propriedade foi a salvação diante de tantos transtornos, uma vez que até caminhão faltou para levar a produção para o armazém.
“A sorte é que tem o silo bolsa para amenizar as perdas. Manda a soja, ela vai para classificação, deu um pouco de avariado, ela fica esperando a logística do armazém para mandar para o porto e a gente aqui na outra ponta fica sem caminhão para poder escoar, quando preciso caminhão eu tenho que pagar dobrado”.

Fábio conta com quase metade dos contratos dos 80% da produção comercializados ainda para cumprir. Ele comenta ao Canal Rural Mato Grosso estar enfrentando dificuldades na hora da entrega da produção, pois há divergências nos laudos de classificação, além de recusa de carga por parte das empresas compradoras.
“A conversa é de parceria. O que eles vendem é… Mas, realmente, não é dessa forma que acontece”, pontua ele.
Armazéns não seguem a mesma tabela
Conforme o produtor Mateus Goldoni, por mais que exista uma tabela de classificação, cada armazém acaba seguindo uma linha.
“Muitas vezes a gente fica escravo da classificação de cada armazém. Prejudica o produtor de estar junto e classificar esse grão”, diz Mateus, que ainda orienta os demais produtores a buscarem saber qual é a tabela utilizada.
Em Água Boa, município vizinho, o Grupo Itaquerê, que cultivou 6.230 hectares nesta safra, também denuncia inconsistências nos laudos de qualidade.
“Tem a questão da umidade e a do avariado. Você manda um produto com 8% a 10% de avariado, que você tem certeza que você classificou e fez a classificação, e teve caso [no armazém] que chegou a 23%, 26% de avariado. Então, você vê que é uma discrepância muito considerável nessa operação”, comenta o gerente administrativo do grupo, Gerlison Ferreira Viana, que chegou a acionar o Classificador Legal, projeto da Aprosoja Mato Grosso, para acompanhar a operação.
A classificadora de grãos credenciada pelo Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa), Jaqueline Arantes Faria, comenta para a reportagem que “a maior parte das empresas sabem como funciona o regulamento, mas muitas vezes não usam o procedimento e muitas vezes falam para gente que elas têm regras próprias delas”.
“Tem casos de empresas que não tem nada de equipamentos, não tem quarteador, ou homogeneizador. Ela pega com uma pazinha, que é bem conhecida, ou com a mão as amostras para determinação de matérias estranhas e impurezas. Isso aí da interferência, totalmente errado, porque tem uma lei que regulamenta isso. Então eles têm que atender conforme a lei”.
De acordo com a classificadora de grãos credenciada pelo Ministério da Agricultura, somente nesta safra 2024/25 foram registradas 30 ocorrências de divergências no Vale do Araguaia.
Programa evita mais de R$ 25 mi em perdas
Com 6.831 laudos emitidos nos últimos quatro anos, o projeto Classificador Legal, da Aprosoja Mato Grosso já evitou perdas superiores a R$ 25 milhões para os agricultores mato-grossenses. Uma média de R$ 3.664,41 por carga.
“O aguardado é que as empresas façam o correto, mas algumas empresas se aproveitam ainda de anos ruins como esse e aplicam descontos abusivos, por isso que a Aprosoja Mato Grosso tem o projeto Classificador Legal, que visa justamente fazer o certo, para termos transparências nas relações”, frisa o presidente da entidade Lucas Costa Beber.
O presidente da Aprosoja Mato Grosso reforça ainda que é importante que o produtor esteja “sempre de olho para acionar o classificador legal e caso necessário também usar de um advogado, usar as provas e todos os recursos que ele tem e o classificador legal serve para isso também e acionar judicialmente essas empresas”.
Para o produtor Altair José Kölln “o que falta é um pouco de bom senso. Se as empresas que recebem o produto não colaborarem, o agricultor vai carecer e o agricultor, carecendo, vai ficar cada vez mais necessitado ou vai parar, vai sair da área dando problema para as tradings que precisam da gente para produzir bem”.
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