Nanotecnologia no agro: ganhos que vão além da ciência

Maior desafio da agricultura é a busca pelo aumento vertical da produção de alimentos e menor impacto ao meio ambiente

plantio soja patrulheiro
Foto: Pedro Silvestre/ Canal Rural MT

O uso da nanotecnologia já é bastante difundido na eletricidade e nos equipamentos eletrônicos, bem como na saúde. Contudo, a sua presença no campo é cada vez mais crescente, gerando menos custo ao produtor rural e mais proteção ao meio ambiente. A ferramenta, inclusive, pode ser utilizada para garantir a produtividade em momentos de emergências, especialmente em condições climáticas adversas. Estudos na cultura da soja mostram, inclusive, incremento de aproximadamente 25% na produtividade.

A nanotecnologia integra conhecimentos da química, biologia, eletrônica, computação e física para estimular o crescimento de plantas. Mais recentemente, a partir dos anos 2000, ela começou a ganhar espaço.

Ao contrário da microtecnologia, tecnologia de fabricação em escala perto do micrometro um µm (milhão de vezes menor que um metro), que levou a criação dos microcomputadores, a nanotecnologia é, explicam os especialistas, um campo científico-tecnológico transversal, disruptivo e pervasivo, dedicada à compreensão, controle e utilização das propriedades da matéria na nanoescala (1,0×10-9m, o equivalente a um bilionésimo do metro).

No agronegócio ela pode gerar uma melhora de qualidade associada ao monitoramento, bem como redução de danos ambiental. No caso da produção agrícola, por exemplo, ela beneficia o emprego da agricultura de precisão, a rastreabilidade dos produtos, a certificação, a produção de biocombustíveis, além da indústria de insumos (fertilizantes, pesticidas).

Hoje, o maior desafio observado na agricultura é a busca pelo aumento vertical da produção de alimentos, com um menor impacto possível ao meio ambiente.

Localizada na divisa dos municípios de Rondonópolis e Itiquira, na região sudeste de Mato Grosso, a Fazenda Gravataí possui foco no agro regenerativo. A propriedade conta com 10,3 mil hectares de área total, sendo 72% destinados para as atividades de lavoura, pecuária e floresta, em sistema de integração.

O engenheiro agrônomo e gerente de produção do grupo Gravataí Agro, Bento Manoel Ferreira, conta que em soja são cultivados hoje 6,2 mil hectares e em milho quatro mil hectares, além de cinco mil hectares de pecuária.

Conforme Bento Manoel, em todo o sistema produtivo é observado uma grande evolução em termos de tecnologias novas, em especial quando olhado para a nanotecnologia.

“A nanotecnologia vem para facilitar, porque ela consegue melhorar todos os produtos através de partículas menores, com eficiência maior na aplicação, eficiência maior no controle e com isso temos um menor desperdício e uma menor contaminação do meio ambiente”, pontua ao Canal Rural Mato Grosso.

O engenheiro agrônomo frisa ainda que “no final de tudo a gente busca uma eficiência melhor com relação ao custo benefício, porque você trabalhando com produtos em menor volume, você tem a mesma eficiência tanto nos fertilizantes quanto nos defensivos”.

Extração do máximo potencial e menor custo

Coordenador da Rede MT-NanoAgro (Rede Mato-grossense de Pesquisa e Inovação em Nanobiotecnologia na Agricultura), e professor de química na da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT), Ailton Terezo afirma que a presença de produtos nanotecnológicos para uso na agricultura estão crescendo fora do Brasil, enquanto no país ainda há um grande potencial a ser explorado.

“Algumas empresas fornecedoras de insumos já exploram a nanotecnologia como, por exemplo, na formação de emulsões estáveis para uso em tecnologia de aplicação de defensivos. Outro exemplo é a ureia protegida contra volatilização e de liberação lenta no solo. Mais recentemente, as nanopartículas de carbono têm ganhado destaque por sua habilidade de acelerar a fotossíntese das plantas e, assim, expressar maior produtividade de algumas culturas”, diz o especialista.

Muito conhecimento de pesquisa, salienta o professor, já está disponível para ser validado no campo em termos de ganhos de produtividade e, consequentemente, rentabilidade, assim como no que diz respeito a impactos significativos do ponto de vista ambiental, logo contribuindo com a sustentabilidade na atividade agrícola.

“Os nanopesticidas de maior eficiência e liberação controlada podem resultar em diminuição significativa das doses usadas atualmente para combater as pragas e ervas daninhas. Isso representa uma redução de custo e ao mesmo tempo proteção do meio ambiente”, frisa Ailton Terezo.

De acordo com o coordenador da Rede MT-NanoAgro, existem quatro formas de atuação da nanotecnologia. As nanopartículas, que podem ser usadas diretamente, a liberação controlada, o condicionamento de solo e os sensores.

“O conjunto destas quatro estratégias de nanotecnologia pode contribuir significativamente para o modelo de produção agrícola. Em termos de produtividade podemos destacar as nanopartículas aceleradoras de fotossíntese por representar um diferencial de produtividade que se pode expressar a partir do manejo atual de solo, fertilizantes e controle de pragas”.

O especialista ressalta ainda que “dentro destes manejos atuais podem ser alcançadas reduções de custo pela utilização de nanofertilizantes mais eficientes, já que atualmente uma grande parte dos macronutrientes não são transportados para as plantas. Ou seja, há perdas no meio do caminho de 49% de nitrogênio, 47% de fósforo e 26% de potássio”.

Tais perdas significativas podem ser reduzidas com o uso de fertilizantes nanoformulados, levando à redução de custos para o produtor.

“Ainda em termos de redução de custos, mas acima de tudo em termos de proteção ambiental, os nanopesticidas podem contribuir muito em termos de redução das doses para o combate das pragas e ervas daninhas”.

Quanto ao manejo de solo, a utilização de condicionadores nanoestruturados pode contribuir para retenção de água e nutrientes e, consequentemente, melhorar a expressão de produtividade da cultura.

“Associado a tudo isso, os nanossensores podem ser utilizados para monitorar a cultura e o meio ambiente e, quando integrados às plataformas de inteligência artificial, contribuir para aprofundar a prática de agricultura de precisão em todas as etapas da produção agrícola, incluindo a precisão no uso de insumos, que representam custo significativo aos produtores”, comenta Ailton Terezo.

Nanopartículas de carbono diante clima adverso

A Rede MT-NanoAgro é uma iniciativa de pesquisadores das instituições públicas de ensino e pesquisa do estado de Mato Grosso que, a partir de 2023, passou a fazer parte do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia em Nanotecnologia para Agricultura Sustentável (INCT-NanoAgro).

Atualmente, dentro do INCT-NanoAgro são realizadas pesquisas em várias frentes de desenvolvimento da nanotecnologia na agricultura. Entre os estudos em andamento na Rede MT-NanoAgro está o efeito promissor do uso de nanopartículas de carbono na agricultura. Segundo Ailton Terezo, pesquisas usando dejetos suínos e esgoto doméstico mostram que tais resíduos são grandes fontes de carbono.

O professor comenta, que dados de pesquisas desenvolvidas na China, apontam que em casos de condições adversas do clima o uso de nanopartículas de carbono contribuiu para ganho de produtividade de 25% na soja, 40% no crescimento de alfaces e garantia de crescimento do milho. Exemplos de inovações que podem transformar a maneira de produzir alimentos.

“Essas nanopartículas de carbono podem ser obtidas a partir de diferentes fontes de matéria orgânica e interagem com a luz solar, podendo acelerar a fotossíntese das plantas. Essa característica representa a possibilidade de ganho em produtividade, uma vez que as plantas crescem mais, especialmente em condições climáticas adversas, como foi o caso da última safra de soja no Brasil”, explica Ailton Terezo.

Ainda segundo ele, o desenvolvimento de tecnologia baseada nas nanopartículas de carbono é de suma importância, “pois certamente novas crises climáticas poderão atingir as regiões produtoras de alimentos no Brasil e no mundo”.

“No caso do milho, os chineses também mostram que as plantas apresentam melhor desenvolvimento das raízes e das partes aéreas quando tratadas com as nanopartículas de carbono. Logo, existe um potencial mostrado nos trabalhos de pesquisa que precisa ser experimentado em condições de campo para validar e posicionar essa nova tecnologia”, diz ao Canal Rural Mato Grosso.

Ao se analisar casos de excesso de chuvas, com encharcamento de solo, prejudicando desenvolvimento das plantas, o especialista salienta que, as nanoestruturas condicionadoras de solo podem alterar a penetração da água e contornar o problema.

Tecnologia aliada da sustentabilidade

A demanda, para não dizer “exigência”, do mundo nos últimos anos por sustentabilidade é crescente e, segundo o presidente da Associação dos Produtores de Soja e Milho de Mato Grosso (Aprosoja-MT), Lucas Costa Beber, o estado apto para atender o que se pede.

“E, para isso a gente precisa de tecnologia para provar. A Aprosoja-MT já desenvolve pesquisas, fazendo esse acompanhamento ao longo dos anos, porque não é só em um ano que você faz a mensuração, mas ao longo dos anos. Há novas tecnologias que barateiam esses estudos. Isso é importantíssimo, porque isso vai provar de fato que o produtor de Mato Grosso, de forma científica, é o mais sustentável do mundo”, diz.

O presidente da Associação frisa ao Canal Rural Mato Grosso que não há dúvidas do quanto a tecnologia é aliada do produtor e da sustentabilidade.

“Com a aplicação do plantio direto podemos fazer duas, até três safras por ano com irrigação ou com o boi na terceira safra. Quanto mais cultura colocarmos no solo, se dermos todos os nutrientes e aplicarmos o plantio direto, maior é o sequestro de carbono. O Brasil é um país muito verde. Nós temos uma abundância que poucos países têm de energia eólica, energia solar e usinas hidrelétricas, que são menos poluentes do que ocorre na Europa com as usinas termelétricas, a gás ou carvão”.

Embora a nanotecnologia tenha o potencial de revolucionar a agricultura, ainda há desafios a serem superados, principalmente para torná-la mais acessível para os agricultores. Um deles é quanto a pesquisa, especialmente em Mato Grosso, uma vez que o custo envolvido é alto e são necessárias parcerias, além do desenvolvimento de novos materiais e tecnologias, bem como testar a campo afim de acelerar e confirmar o seu potencial.


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