Um ano de extremos. É assim que 2023 ficará marcado para a agricultura mato-grossense. Após colher safras recordes de soja e milho, agricultores no estado enfrentam um cenário de incertezas climáticas, políticas, além de financeiras, diante da desvalorização dos grãos. Para 2024, a palavra de ordem será “cautela”.
Desde o início de novembro a chuva tem sido regular na lavoura de soja do agricultor Ereno Giacomelli em Jaciara, na região sudeste de Mato Grosso. A boa umidade no solo tem contribuído para o desempenho da plantação. Entretanto, ele afirma seguir cauteloso com a produtividade esperada na área de 1,7 mil hectares.
“Toda semana praticamente dá uma garoa. Dá uma chuvinha boa de uns 10, 30 milímetros. Não é que esteja chovendo aquela abundância, mas está tudo dentro do limite. Agora, daqui para a frente, nós não podemos passar uma semana, dez dias sem chuva porque é época de enchimento de grão. É a hora crítica”.
A insegurança de Ereno tem motivo: a falta de chuva durante o início do plantio da soja acabou prejudicando o planejamento da segunda safra de milho, outra fonte de receita importante para a fazenda.
Conforme o agricultor de Jaciara, logo que os trabalhos de semeadura começaram ele teve que segurar, pois as chuvas cessaram e as máquinas tiveram que ficar paradas por cerca de 16 dias.
“Isso comprometei a área de safrinha. Tanto que a gente já desenhou plantar só 600 hectares de milho. Vamos fazer a coisa bem feita. Menos área, mas bem feita para tentar produzir como se fosse a área total. É um ano escuro, um ano negro para nós. Você tem que trabalhar com o pé firme, no chão. Não dá para fazer loucura, ainda mais em um ano desse tipo”, diz Ereno.
Ainda segundo Ereno, é preciso “segurar muito bem as pontas para você conseguir sobreviver esse ano. O agricultor tem que colocar o pé no freio, porque eu acho que o ano pior ainda vai vir. A parte econômica do governo”.
Safra recorde, rentabilidade em baixa
O cenário atual contrasta com o registrado na temporada 2022/23, quando Mato grosso colheu safras recordes. Na soja foram mais de 45,3 milhões de toneladas. Já no milho cerca de 52,3 milhões de toneladas do grão.
Apesar disso, a produção histórica em Mato Grosso não garantiu a rentabilidade que era esperada. Tanto o milho quanto a soja registraram preços baixos em relação a 2022, comprometendo as expectativas dos agricultores.
Presidente do Sindicato Rural de Diamantino, Altemar Kröling, pontua que a questão dos preços pegou todos de surpresa.
“Não achávamos que iria recuar tanto os preços como veio acontecer. O produtor acabou se descapitalizando. ele tinha uma quantia de contrato que salvou o ano e nós viemos agora para esse plantio 2023/24 e o clima também pregou uma peça em nós. As chuvas irregulares ainda não normalizaram. A gente plantou com expectativa de colher acima de 60 sacas por hectare e veio essa estiagem que vai roubar e levar essa margem nossa embora”.
Conforme Kröling, a lição de casa do produtor no momento é “ter os pés no chão, fazer investimento de acordo com a sua capacidade, não comprometer muito a produção antes dela se confirmar no campo”.
Safra 2023/24 frustrada e crise na 2024/25
O presidente do Sindicato Rural de Canarana, Alex Wisch, classifica a safra 2023/24 como “uma safra frustrada já desde agora”. Ele pontua que, apesar da boa produção da temporada passada, os preços não trouxeram rentabilidade para o produtor e somando as perspectivas do atual ciclo teme-se pelo futuro da atividade lá na frente.
Alex lembra que os financiamentos são de longo prazo, em alguns casos chegando há 10 anos. De acordo com ele, quem financiou há três anos não se encontra nem com 50% do maquinário pago.
“Então, com certeza teremos problemas sérios para a frente. Infelizmente se não for feito nada pela frente para melhor os preços das principais commodities, para que o pouco que a gente possa produzir dê uma rentabilidade mínima para o agricultor pelo menos arcar com essa despesa, a gente vai ter sérios problemas. [Na safra] 2024/25 tende a ter uma crise muito grande no agro se persistir essa questão climática e queda de preços”.
O presidente do Sindicato Rural de Canarana salienta sobre os preços dos grãos que o setor no momento “não vê com bons olhos e não consegue enxergar uma luz no final do túnel”.
Apesar disso, o presidente do Sindicato Rural de Sinop, Ilson José Redivo, afirma que é preciso não perder a “esperança”.
“Cada um tem que ter otimismo, esperança e buscar mecanismos para superar isso e administrar isso. Não é a primeira crise que nós atravessamos e não será a última. E vamos superar esse momento com toda certeza”.
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